terça-feira, 15 de julho de 2025

Felicidade - Alessandro Brito

  
 
Eu nunca temi a morte, nada mais natural pra quem sobreviveu ao lado dela, desde sempre. E provavelmente por não temê-la, sempre (mesmo de forma inconsciente ou inconsequente) vivi intensamente.

Às vezes me sinto um personagem de Macondo, vivendo meus anos de pura solidão (muito embora, por vezes, em meio a multidão). E mesmo nesses momentos não alivio na intensidade, eu sinto, mas sinto a ponto de deixar-me estremecer a carne. O coração cada vez mais vulnerável, quanto mais envelheço mas sinto-me tomado pela vulnerabilidade de sentir, segue implacavelmente batendo e apanhando.

E nesse movimento de sentir desvairadamente me percebo sempre numa busca, que parece infinda, de ter uma companheira (já me debrucei tantas vezes a respeito desse tema). Me permito muito, me apaixono raramente. Acredito que são nessas raras vezes que sinto o pulsar da vida rasgar minhas artérias e meu corpo planar, desconsiderando totalmente as leis da física.

Nessas raras vezes em que me apaixono, arrisco, me jogo no precipício e voo em queda livre. E esse é o adjetivo perfeito: "livre". Liberdade das amarras sociais, que nos moldam e nos encabrestam, liberdade para escolher, mesmo sem garantia de êxito. Liberdade para ser e sentir.

Toda ação tem uma reação, tenho me machucado nesses últimos anos. As marcas e feridas são inevitáveis, mas a sede de viver é muito maior. Quanto vale ser quem você é e viver como você vive? Ainda tenho conseguido pagar o preço de ter coragem e me permito apenas ser quem quero ser (antes de tudo um forte). 

A vida, pra mim, se resume em: Morrer (um dia desses qualquer); fazer escolhas (o resto são apenas consequências) e afetos. O resto é banalidade.

Do que vi e vivi, trago a certeza que essas passagens são invioláveis. Quando me deparo com tempos difíceis de tristezas, amarguras e desilusões (como a gente ilude e se desilude, não!? Tudo tão fugaz) procuro na memória essas gavetas de lembranças, revisito-as e é como se fosse um novo sopro de vida emergindo dentro de mim. As lembranças de momentos felizes me fazem crer que a felicidade é infatigável. Mesmo quando centelha, mesmo quando não passa de pequenos momentos, ela é capaz de mudar todo o cenário, para sempre, até mesmo quando o "para sempre" se perde nas atitudes.

Me abasteço com essas vivências rememoradas, olho pra frente e marcho. Não evita meu sofrimento e não alivia a dor das desventuras, mas tem sido suficiente para que eu posso recomeçar.   

 

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